Há expressões que são impossíveis de traduzir para outro idioma sem lhes tirar significado, o que é uma pena. Por exemplo, em castelhano/espanhol, existe uma que eu gosto muito: hacer el ridículo. É fácil perceber que hacer el ridículo, traduzido à letra, é “fazer o ridículo”, que consiste em protagonizar uma situação ridícula ou ter um comportamento ridículo. E porque gosto desta expressão? Porque suaviza a crítica. É mais fácil dizer que alguém está a ser ridículo do que dizer que essa pessoa o é sempre, apesar se, normalmente, ser coincidente.
Por exemplo, quem sou eu para dizer que o Comité Olímpico Internacional, o seu presidente ou um vice-presidente da Agência Mundial Anti-doping são ridículos? Foram eleitas para os cargos (teoricamente) por pessoas capazes, sem quaisquer interesses a não ser defender o deporto (no caso do COI) e a sua transparência quanto ao doping (no caso da AMA). Mas posso suavizar a crítica se o disser de outra forma.
Eu poderia chamar-lhe “um caso de hipocrisia”, mas não quero entrar por aí e vou chamar-lhe “caso 1”: O que é a NBA? Uma liga desportiva ou uma liga de entretenimento? Eu, como adepto do basquetebol e da NBA em particular, tenho as minhas dificuldades em responder. Há jogos todos os dias, os jogadores têm cerca de 15 jogos por mês e jogam desde Nova Iorque até Los Angeles, uma cidade com vista para o Atlântico e outra para o Pacífico. Por mês têm 15 jogos e um sem-fim de viagens, que nem lhes dá tempo para treinar. Como é que eles aguentam? Com a ajuda de muitos produtos proibidos pela Agência Mundial Anti-doping, e não pensem que estou a dar uma novidade. Toda a gente sabe isto. Os adeptos, como eu, não ligam porque querem espectáculo, o COI não liga porque a NBA tem muito dinheiro e, pelo mesmo motivo, a AMA não se mete lá. Os controlos anti-doping são da responsabilidade da NBA, que quer os jogadores a jogarem 15 dias por mês mas não quer que as suas estrelas sejam manchadas por doping para não assustar os milhões dos patrocinadores. Então, obviamente os craques estão à vontade e os outros também, desde que não tomem cocaína nem nada do género. Ainda recentemente houve um basquetebolista num caso semelhante ao Rui Costa e foi suspenso por… 10 jogos. Sim, algo como 20 dias.
Devem estar a pensar isto não é um blog de ciclismo? Pois, vamos então ao que interessa: a NBA tem tanto doping que só em 1992 os seus jogadores passaram a poder ir aos Jogos Olímpicos. Até lá, tinham que ir jogadores universitários porque no COI sabiam como funcionava a NBA (recordo que a AMA não entra lá para controlar ninguém) e não os aceitavam. Nada mudou entretanto, mas em 92 os milhões de euros e mediatismo da NBA convenceu o COI a aceitar os jogadores da NBA nos Jogos Olímpicos. Então, como podemos encarar quando alguém do COI fala na possibilidade do ciclismo deixar de ser olímpico por ter doping? Eu, quando vejo essa situação, rio e, para não dizer que o presidente do COI é ridículo… digo que está a fazer o ridículo. É mais suave.
Passemos agora a ao caso que me fez lembrar do primeiro, um caso mais recente e mais simples:
O presidente da Comissão Médica do COI e vice-presidente da AMA, um sueco chamado Arne Ljungqvist que aproveitou o caso o caso Contador para ter espaço nos jornais, faz aquilo a que se chama… não, não vou dizer já.
O tal Arne Ljungqvist, diz que “se vives e comes normalmente, não dás positivo”, isto sobre o Contador. Ora, o Laboratório Anti-Doping de Colónia, um dos mais desenvolvidos do mundo e que detectou os 50 picogramas/ml de Contador, fez um estudo e concluiu que 22 em cada 28 pessoas que viajam para a China, voltam com baixos níveis de clembuterol. Ou seja, o COI meteu os Jogos Olímpicos de 2008 num país onde não se pode comer nem viver normalmente, como todos já sabíamos. Então, O que se pode dizer? Ridículo.