sexta-feira, 25 de março de 2011

Caso Contador: tem que dar sangue, dê por onde der

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As semelhanças entre o Caso Contador e as telenovelas mexicanas vão para além do castelhano como língua predominante e, como em qualquer boa telenovela, quando parece que tudo está decidido, aparece algo que muda todo o estado de coisas e relança o enredo. Porém, aqui não há gravações prévias e como tal não há revistas cor-de-rosa que nos digam quem triunfará no final, tal como não há uma lado bom e um lado mau de censo comum, cabendo a cada “espectador” tirar as suas ilações.
A minha opinião sobre este caso já aqui foi deixada em traços gerais (I, II, III) e tornava-se desnecessário voltar a escrever sobre este tema se Pat McQuaid e a UCI que dirige (ou na qual manda) não decidissem criar mais uma daquelas situações das quais o ciclismo deveria fugir. Referida associação, que deveria ser o principal defensor da modalidade mas tem sido principal responsável em alguns dos maiores escândalos dos últimos anos, decidiu, a terminar o prazo, recorrer sobre a ilibação de Alberto Contador. O Tribunal Arbitral Desportivo (TAS, no seu idioma de origem, o francês), terá agora que decidir se Contador é ou não suspenso pelos 50 pictogramos de Clembuterol e, com um pouco de sorte, a decisão sai durante ou depois da Volta a França.
Ora continuemos:


Na verdade, não é a primeira vez que a UCI lida mal com a ilibação de um ciclista. Em 2007, quando Iban Mayo acusou EPO num controlo anti-doping, pediu a contra-análise. Ora, a contra-análise, que deveria ser um segundo teste independente, no entender da UCI apenas serve para confirmar casos positivos. Como esta contra-análise deu negativa, o que ilibaria o ciclista, a UCI pediu uma segunda contra-análise (uma espécie de contra-análise-da-contra-análise), que deu positivo. Nunca se saberá se a 3ª análise foi realizada correctamente ou apenas para dar o resultado que a UCI queria, mas o certo é que Mayo foi suspenso e acabou por terminar carreira, na primeira grande caça às bruxas da era-Pat McQuaid
Agora no caso Contador, que foi ilibado pela federação do seu país (em primeiro lugar, são as federações nacionais as responsáveis por suspender, ou não, os ciclistas), a UCI decidiu recorrer para o TAS, algo totalmente dentro dos seus direitos mas totalmente desnecessário e extremamente prejudicial para a modalidade.
Desnecessário porque não é a primeira vez que um desportista é inocentado de um controlo anti-doping positivo por se considerar que não tem responsabilidade pela ingestão da substância detectada (Ver o caso do tenista Richard Gasquet) e temos que deixar de querer parecer extremamente aplicados na luta contra ao doping, se não sabemos como tornar essa luta em algo positivo para a imagem da modalidade. Aliás, nem é a primeira vez que alguém acusa esta substância e é ilibado pelos mesmos motivos de Contador.
Desnecessário porque está na hora da UCI abandonar esta política de recorrer sempre que alguém é ilibado, transmitindo a ideia de que é impossível um ciclista não se dopar voluntariamente. Apesar de, em todos os casos, defender que se faça justiça, defendo também que essa justiça seja aceite. E, apesar de o recurso ser um direito da UCI, está na hora desta aceitar os veredictos que não condenam o acusado, deixando de querer sangue em todos os julgamentos/processos e recorrendo da decisão sempre que não há sangue.
Prejudicial para a modalidade porque Alberto Contador está a correr desde o momento que foi absolvido, inclusive já tem vitórias, e mais uma vez teremos um ciclista a correr enquanto é julgado nos tribunais por uma pseudo luta anti-doping onde se tenta parecer mais sérios do que se tenta ser.

Prejudicial para a modalidade porque durante meses se vai falar neste processo sempre que Contador estiver presente numa prova, prejudicando o ciclista, a equipa, as provas e, como consequência disto tudo, o ciclismo. Realço que não estamos a falar de alguém que não foi julgado mas sim de alguém que foi julgado e absolvido por quem de direito.
Prejudicial para a modalidade porque a UCI esperou até ao final do prazo para apresentar o recurso e, em consequência disso, dificilmente o veredicto sairá antes do arranque do Tour, como admitiu o secretário geral do TAS. Poderemos ter o caso de, a começar a mais mediática prova do calendário internacional, o vencedor das duas últimas edições (e com outra anteriormente) ter um processo a decorrer no TAS.
Resta esperar que o TAS mantenha a decisão da Real Federação Espanhola de Ciclismo e reitere a inocência de Contador, tal como fez com Gasquet, evitando males maiores para o ciclismo. Entretanto, fica a curiosidade de saber se a UCI também vai recorrer sobre o dinamarquês Philip Nielsen ou deixa passar por ser um ciclista menos mediático.


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Na Volta à Catalunha, Manuel Cardoso venceu a etapa de ontem. Tem agora duas vitórias em provas Pro Tour e nós estamos perante a melhor geração de ciclistas portugueses de sempre, com vários ciclistas a disputar os primeiros lugares de algumas das mais importantes provas mundiais. Parabéns a todos eles!

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A partir de agora, os artigos serão publicados no blog neste formato de “Continuar a ler…”. Assim podem estar mais artigos na primeira página e torna-se mais fácil os leitores procurarem por algum que queiram.
Para começarem a entrar no tema do próximo texto, sugiro a leitura deste do jornalista Manuel José Madeira, em Julho de 2007.

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